Bem-vindos ao Cinema & Consciência, um novo espaço para a difusão e a discussão do cinema brasileiro e internacional. Vamos falar de filmes ou documentários, discutir ética e estética do cinema, com enfoque nas pessoas, nos temas e nos fatos. Os comentários dos visitantes serão sempre bem-vindos.

Todos os textos neste blog são de autoria de Mário Luna, salvo aqueles em que a fonte for mencionada.
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"Não acredite em nada que ler ou ouvir neste blog. Reflita. Tenha as suas próprias opiniões e conclusões"





quarta-feira, 10 de março de 2010

Série Entrevistas - Volume 3: Ingmar Bergman


Entrevistas com o diretor sueco, Ingmar Bergman, para a BBC inglesa.


PARTE 1



PARTE 2



PARTE 3



PARTE 4



PARTE 5



PARTE 6

terça-feira, 9 de março de 2010

A Imprevisibilidade Previsível do Oscar

No hace falta posts sobre os ganhadors do Oscar, porque essa notícia muitos já devem ter recebido de diversas fontes na web. A mais interessante e amplamente discutida no pré e pós evento, no entanto, está no blog O Cinemtógrafo http://o-cinematografo.blogspot.com/. Mas vale a pena algumas linhas sobre a festa da Academia de Holywood, que, de tão imprevisível, se tornou previsível.

Desde a ausência de 2012, um filme que chegou arrebatando platéias e lotando cinemas já na primeira semana, com orçamento milionário e show pirotécnico de efeitos especiais, eu já previa um ano de muitas surpresas. Mas ver o trabalho multimilionário de James Cameron (vide Titanic) e recordista de bilheteria de todos os tempos Avatar perder para Guerra ao Terror, com modesto orçamento e uma diretora que podemos perguntar sem medo, "quem é ela ?" foi além das expectativas em torno das surpresas. Que Jeff Bridges passou ao largo em praticamente tudo que fez até hoje e Sandra Bullock é a queridinha da América não é surpresa. Ok. Eles parecem ter realizado o grande trabalho da vida deles no ano passado - não vi suas atuações. Mas é igualemte surpreendente ver uma ex-campeã das listas dos piores do ano ganhar de Helen Mirren e Merryl Streap, além da estreante de Precious, Gabourey Sidibe, cuja mãe, pasmem, recusou o papel de ser a mãe da própria filha no drama e seguiu tocando e cantando nas estações de metro de Nova Iorque, onde ela ganha um Oscar todos os dias.

O ponto alto da noite ficou por conta do documentário vencedor. The Cove chacoalhou os discretos japoneses e causou rebuliço na população afetada pelas imagens de suas práticas nada ecológicas - porque não dizer nada humanas. Depois do prêmio, os japoneses enlouqueceram, protestaram, se defenderam e proibiram a exibição do filme no Japão (terá sido isso mesmo ?). Foi como se eles dissessem ao mundo, "vocês não têm o direito de vir aqui e ver como somos desumanos." Por lá, parece que matar golfinhos é uma prática de fundo cultural, típica, quase um cartão postal da região. Nesse ponto, paramos e perguntamos: como o ser humano se acostuma à maldade e a transforma em idílicos culturais ? ou mesmo, como julgamos ter direito de sermos perversos ? Bem, se na Arábia se decapita a espadas em praça pública, nos Estados Unidos se pune presos, a maioria negros, com injeções letais, na China quase 10.000 chineses são condenados a morrer todos os anos com uma bala paga pela própria família, alguns deles por conta de cheques sem fundos, porque no Japão não se pode matar golfinhos culturalmente ? Mas o mundo legal (leia-se, das leis) garante, "você pode matar à vontade, desde que tenha uma boa razão para isso e esteja dentro da lei." Parem esse mundo que eu quero descer ! Hey, antes de descer assista The Cove !

sábado, 6 de março de 2010

Neste Mundo Humanamente Frágil

No campo de refugiados de Shamshatoo, localizado na cidade de Baxery no Paquistão, viviam 53 mil refugiados afegãos em 2002, época em que o diretor inglês Michael Winterbottom filmou Neste Mundo. Fugidos primeiramente da invasão soviética em 1979, e depois dos bombardeios americanos em 2001, a população afegã refugiada passou a viver em condições precárias e de pobreza extrema, situação que perdura até hoje.

Muitas crianças nasceram no campo e algumas delas trabalham por menos de 1 dólar por dia, como é o caso do protagonista do filme, Jamal. Em Shamshatoo falta dinheiro, educação, saúde e a comida é racionada. A ração diária da população é de 480g de farinha de trigo, 25g de óleo vegetal e 60g de sementes. Cada família recebe uma tenda, uma capa plástica, três cobertores e um fogão. Os gastos com refugiados ficam muito aquém dos 7,9 bilhões de dólares detonados nos bombardeios americanos, que começaram em 7 de outubro de 2001 sob o pretexto de procurar Osama Bin Laden ou derrubar Saddam Hussein - bem, ambos os motivos são válidos. A ONU afirma que não tem verba suficiente. "Nosso orçamento estimado para lidar com o problema dos refugiados nesses primeiros meses é de pelo menos US$ 50 milhões, e temos pouco mais de 30% dessa quantia", afirmara Peter Kessler, 39, porta-voz da organização no Paquistão, no começo do confltio.

O cenário em Shamshatoo é o de uma favela em más condições. Casas de pau-a-pique e mesquitas recém-construídas disputam o pouco espaço do lugar. Boa parte do campo só tem barracas de lona desordenadas, onde é comum ver crianças pedindo comida ou qualquer outra coisa. Nas 21 escolas existentes não há condições de ensino para os professores nem de estudo para os alunos. "Aqui, quando falta giz, a gente dá aula escrevendo no chão", afirma Saeed Mahboab, 45. "Cerca de 90% dos alunos são órfãos de pai." Cada barraca funciona como uma sala de aula. Espremidas em pouco mais de 15 m2, as crianças têm aulas de disciplinas como matemática e religião.

No aspecto político, a situação não fica nem um pouco melhor. Em Shamshatoo, a ONU, o Taleban, ONGs missionárias e organizações extremistas islâmicas dividem espaço sob olhares de desconfiança e ódio mesmo. A falta de recursos gera conflitos e preconceitos dos paquistaneses contra os afegãos. Segundo a ONU, há 203 campos de refugiados no país que não têm estrutura para funcionar de maneira humanamente aceitável. Os afegãos são acusados de causar desemprego e há um clima de animosidade generalizada na região. Kessler, que esteve em campos de refugiados em Ruanda, Congo, Kosovo e Bósnia, faz um diagnóstico pessimista. "Este é o pior acampamento em que já trabalhei. Em Ruanda, a miséria era imensa, mas havia solidariedade, os vizinhos tentavam ajudar. Aqui, há ódio."

Na saúde, "as condições (também) são ruins," como afirma o médico e refugiado Ahmad Karimi, 32, que trabalha em um dos postos de saúde. "Doenças como cólera, febre tifóide e leishmaniose são comuns." A temperatura na região chega facilmente a 50°C no verão. Dentro das barracas atinge 60°C, fazendo com que não apenas haja mais proliferação de doenças como um enfraquecimento físico da população para combatê-las.

Nesse cenário de pesadelo, muitos não resistem e morrem. Outras centenas tentam fugir no desespero e encontram a morte um pouco mais além, nas estradas da fronteira, minadas por contrabandistas de gente, policiais corruptos e grupos de combatentes de ambos os lados da guerra, armados até os dentes. Só no último mês, cerca de 60 mil afegãos cruzaram a fronteira paquistanesa, engordando o contingente de mais de 2 milhões que fugiram desde a invasão soviética. Vivendo de subempregos nas grandes cidades, não são poucos os que partem para a mendicância ou para atividades ilícitas, como o contrabando e o tráfico de drogas. A ONU calcula que só o conflito com os EUA produziu um contigente de mais de 1 milhão de fugitivos afegãos.

O número de vítimas de uma guerra é significativamente maior do que aqueles que dão conta dos mortos em combate. Embora possam existir argumentos psicológicos, políticos, históricos e culturais para a deflagração de uma guerra, o que ela representa é, na verdade, uma extorsão humana. Em benefício de uma irrisória minoria criam-se os custos incomensuráveis de uma maioria incólume: a população civil. Aquele que busca a informação apenas nas reportagens dos meios de comunicação, certamente, não sabe que durante os três primeiros meses da guerra americana no Afeganistão, o número de mortos na população civil ultrapassou 3.700 (vítimas). Um número maior do que o de mortos no ataque de 11 de setembro, em Nova Iorque.

Se somarmos o risco do combate propriamente dito aos riscos colaterais causados por ele, podemos considerar aqui as minas terrestres, a destruição dos sistemas hídricos e de esgoto, as bombas cluster e as cápsulas de urânio como fatores exponenciais de destruição humana, alargando seguramente o número de mortos na população civil. Acrescentando-se, claro, os mortos da retaliação, por conta dos efeitos em cadeia na teia internacional do conflito, uma espiral tão ensandecida e incoerente de crimes contra a humanidade que o combate ao terror é o verdadeiro e mais temido terror.

Para esse universo apocalíptico, Michael Winterbottom levou seis pessoas na sua equipe, encontrou localmente seus atores, todos amadores, e construiu, quase artesanalmente, uma obra consistente, comovente e chocante. No estilo documental, isto é, uma camera na mão, alguma granulação na imagem em certos momentos, narrativa em off e diálogos improvisados de acordo com a ocasião, Winterbottom nos mostra a saga de dois primos que decidem tentar a vida em Londres, literalmente fugindo de Shamshatoo.

O filme retrata a tentativa desesperada de muitos refugiados de buscar uma vida melhor muito longe da guerra e o papel do sonho nessa decisão arriscada, como combustível vital para a dura, incerta e não raramente inútil jornada. No trajeto até Londres não faltam obstáculos, policiais corruptos, contrabandistas de fronteira, aproveitadores e criminosos. Numa viagem imprevisível e quase suicida, os dois partem cheios de esperanças e com uma ingenuidade lamentável na bagagem.

Neste Mundo é um road movie que deixa a paisagem das estradas de pano de fundo para mostrar não só os exageros inevitáveis da vida, para quem vive num universo de condições extremamente precárias, mas sobretudo a intolerância humana e o desprezo das potências políticas com relação ao mundo pobre. O filme ganhou o Urso de Ouro do Festival de Berlim em 2003, assim como outros prêmios europeus importantes.



quinta-feira, 4 de março de 2010

Tributo às Grandes Atrizes

Em mais uma grande montagem de Philip Scott Johnson, desta vez, um tributo às grandes atrizes. Um trabalho comovente e um time espectacular.

Mary Pickford, Lillian Gish, Gloria Swanson, Marlene Dietrich, Norma Shearer, Ruth Chatterton, Jean Harlow, Katharine Hepburn, Carole Lombard, Bette Davis, Greta Garbo, Barbara Stanwyck, Vivien Leigh, Greer Garson, Hedy Lamarr, Rita Hayworth, Gene Tierney, Olivia de Havilland, Ingrid Bergman, Joan Crawford, Ginger Rogers, Loretta Young, Deborah Kerr, Judy Garland, Anne Baxter, Lauren Bacall, Susan Hayward, Ava Gardner, Marilyn Monroe, Grace Kelly, Lana Turner, Elizabeth Taylor, Kim Novak, Audrey Hepburn, Dorothy Dandridge, Shirley MacLaine, Natalie Wood, Rita Moreno, Janet Leigh, Brigitte Bardot, Sophia Loren, Ann Margret, Julie Andrews, Raquel Welch, Tuesday Weld, Jane Fonda, Julie Christie, Faye Dunaway, Catherine Deneuve, Jacqueline Bisset, Candice Bergen, Isabella Rossellini, Diane Keaton, Goldie Hawn, Meryl Streep, Susan Sarandon, Jessica Lange, Michelle Pfeiffer, Sigourney Weaver, Kathleen Turner, Holly Hunter, Jodie Foster, Angela Bassett, Demi Moore, Sharon Stone, Meg Ryan, Julia Roberts, Salma Hayek, Sandra Bullock, Julianne Moore, Diane Lane, Nicole Kidman, Catherine Zeta-Jones, Angelina Jolie, Charlize Theron, Reese Witherspoon, Halle Berry

Music: Bach's Prelude from Suite for Solo Cello No. 1 in G Major, BWV 1007 performed by Yo-Yo Ma

domingo, 28 de fevereiro de 2010

A Difícil Arte de Ser o Outro

Colocar-se na posição do outro e compreender sua realidade é uma árdua tarefa. Mas, se ao menos uma vez fosse realizada, nunca mais falaríamos mal de ninguém. Paradoxalmente, tal esforço é justamente o que nos faz crescer como consciência intrafísica. Isso torna a vida mais complexa, de certo. Mas isso já sabíamos. A vida em si não é nada simples como muitos acreditam. Sem uma decente compreensão da realidade à nossa volta, seja quão humilde essa compreensão for, nosso esforço em nos conhecer está comprometido com o insucesso, pois uma grande parte do que somos representa a maneira como nos relacionamos com o mundo exterior. O homem isolado vegeta.

Cao Guimarães apresenta nesse documentário a voz do outro e o resultado surpreende, pois o que se vê é que, ao viver o outro, permitimos uma grande exposição de nós mesmos. Não há como viver a realidade de alguém sem refletir no outro a nossa própria imagem. A versão que podemos a dar a qualquer elemento externo a nós mesmos contém invariavelmente a nossa impressão. É dizer, a nossa visão do outro constrói o outro a partir de nós mesmos. Mas esse jogo é uma via de mão dupla. Na mesma medida em que construímos o outro, somos construídos por ele. Se você recebesse um convite para permitir que um estranho vivesse em sua casa por uma semana, sem ele jamais ter lhe visto antes, que imagem esse estranho faria de você ao final de 7 dias ? Se nossos pertences refletem o que somos, de que forma estamos representados ?

A decoração, a harmonia, as cores, o estilo, a organização, a disposição dos objetos, os próprios objetos, enfim, tudo que temos pode nos desnudar. Isso, obviamente, na dimensão física, pois a energia do ambiente também contém nossas energias vitais como digitais. No documentário de Cao Guimarães isso fica num nível subliminar. Rua de Mão Dupla mostra suas linhas centrais já nas primeiras imagens do filme. Cao Guimarães convidou seis pessoas pertencentes às camadas médias da população, moradores solitários de Belo Horizonte, a participar de uma experiência inusitada: divididos em duplas, eles trocariam de casa por 24 horas e, munidos de uma câmera digital, filmariam o que bem lhes aprouvesse em casa alheia, tentando elaborar uma imagem mental do morador ausente, através da convivência com seus objetos pessoais e seu universo domiciliar. Ao final, dariam um depoimento para a câmera, contando como imaginaram esse morador, ou esse "outro".

O resultado da experiência é bastante interessante por todas as questões explicitadas acima. É fascinante ver como traçamos nossos retratos no que possuímos, no padrão das nossas energias no ambiente em que vivemos (na verdade, e em qualquer um em que estejamos) e como a percepção humana pode ser tão aguçada ao ponto de nos desnudar com um simples olhar em volta, mesmo quando o observador não pode nos ver. O cineasta mineiro Cao Guimarãese soma cinco longas-metragens e algo em torno de 20 curtas, segundo o próprio, mas, infelizmente, tem visibilidade zero entre o público não frequentador de festivais. Cao possui um estilo espirituoso e desafiador e já ganhou aqui um marcador depois de Rua de Mão Dupla.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Tributo aos Grandes Atores

A difícil arte de homenagear é para poucos, pois sempre achamos algum injustiçado ausente do grupo de homenageados. Inevitável. Bem, seja como for, esta montagem de Philip Scott Johnson é uma obra prima. Nela, encontramos sempre algum link de semelhança em Douglas Fairbanks Sr., Rudolph Valentino, Charlie Chaplin, James Cagney, Spencer Tracy, Fredric March, Errol Flynn, Fred Astaire, Clark Gable, Laurence Olivier, Gary Cooper, Humphrey Bogart, James Stewart, Tyrone Power, Cary Grant, Henry Fonda, Robert Mitchum, John Wayne, Kirk Douglas, Gene Kelly, Burt Lancaster, William Holden, Marlon Brando, James Dean, Rock Hudson, Montgomery Clift, Anthony Quinn, Gregory Peck, Richard Burton, Jack Lemmon, Sean Connery, Sidney Poitier, Charlton Heston, Steve McQueen, Peter O'Toole, Paul Newman, Clint Eastwood, Robert Redford, Dustin Hoffman, Roy Scheider, Warren Beatty, Dennis Hopper, Al Pacino, Jack Nicholson, Robert De Niro, Gene Hackman, Jon Voight, Harrison Ford, Kevin Kline, Kevin Costner, Michael Douglas, Christopher Walken, Mel Gibson, Sean Penn, John Travolta, Antonio Banderas, Tim Robbins, Samuel L. Jackson, Tom Hanks, Denzel Washington, Tom Cruise, Brad Pitt, Russell Crowe, Kevin Spacey, Will Smith, Jamie Foxx, Leonardo DiCaprio, Johnny Depp, Matt Damon, George Clooney. Parabéns, Philip Scott Johnson, pelo belíssimo trabalho.

A música fica por conta da interpretação de Antonio Menezes para a Suite para Solo de Cello n° 3 em C Maior BWV 1009 de Sebastian Bach.



domingo, 14 de fevereiro de 2010

O Começo da Linguagem

O clássico do diretor francês Jean-Jacques Annaud poderia muito bem suplantar muitas aulas de pré-história do ensino médio dada a sua importância histórica. Mas como explicar para os adolescentes de hoje a revolução causada pela descoberta do fogo e o uso da roda, numa época em que muitos deles usam gadgets de alta tecnologia, inventos já muito a frente dos incríveis canivetes suiços da geração anterior ?

O desafio dos professores ao abordar tópicos da história do homem é vencer a condição sonífera das histórias milenares, num tempo em que falar de pedra lascada e pinturas rupestres não parece um bom programa. Os obstáculos do ensino da história do homem não ficam apenas na dificuldade de se encontrar meios interativos e visualmente interessantes para alunos de escolas. Com um sistema de ensino retrógrado, pouco criativo e não muito afeito à cultura da leitura, da pesquisa e da visita a museus, adolescentes se tornam adultos desinformados e desinteressados na sua própria história no mundo.

O filme A Guerra do Fogo propõe uma aula de história bem legal e visualmente muito interessante, e como todo bom filme educativo e didático, ele faz parte dessa classe de filmes que ensinam, o que, diga-se, é, infelizmente, obra rara hoje em dia. A pré-história tem sido sistematicamente renegada no cinema, salvo raras exceções. Há referências à época em 2001, Uma Odisséia no Espaço ou em O Planeta dos Macacos. Como tema central, a situação é frustrante. O assunto tem sido basicamente tratado em comédias e desenhos, como, por exemplo, em Meu Amigão das Cavernas, Os Flinstones e A Era do Gelo. No caso de 10.000 a.c., apesar do seu orçamento milionário e caráter blockbuster, o filme fica muito aquém da obra de Annaud.

Lançado em 1981, numa produção Franco-Canadense, A Guerra do Fogo é uma obra que tem como objetivo levantar hipótese sobre a origem da linguagem. Para representar fielmente a época, há ausência total de linguagem verbal no filme e isso é um tanto quanto óbvio, mas o recurso dá seriedade ao trabalho e reforça a carga dramática da história dos três homo sapiens em busca de uma nova fonte de fogo para sua tribo. O fogo é então um elemento divino. Mas observar as interelações entre esses seres humanos de outrora também é uma tarefa prazerosa para os amantes da pré-história e interessados na própria história do homem no planeta. E não será difícil encontrar similitudes de comportamento com os homo sapiens sapiens de hoje, que, em muitas ocasiões, ainda seguem grunhindo.

A maneira como esses três hominídeos se relacionam, se comunicam e disputam territórios com animais e outras tribos menos desenvolvidas é destaque no roteiro assinado por ninguém menos do que Anthony Burguess, foneticista e consagrado autor do livro Laranja Mecânica. Seu trabalho não deixa dúvida nem desconfianças sobre os fatos históricos apresentados. Há momentos antológicos no filme, como a cena em que um dos homens ancestrais joga uma pedra pesada no outro e todos, até o apedrejado, têm um ataque de riso. Em outro momento, algumas fêmeas à beira de um riacho são surpreendidas sexualmente por alguns machos das cavernas e "a coisa" acontece sem repúdio nem acusações de estupro, tudo ali, nesse sentido, é muito natural, mostrando que o homem, desde a sua origem, é um ser prazerosamente sexualizado.

A Guerra do Fogo surpreende o público pela simplicidade da produção e sensibilidade com que trata o intrigante tema da pré-história, ainda recheado de muitas teorias e poucas certezas, um feito não muito fácil sem a classificação de entediante. O filme deve ficar na sua prateleira para uma boa aula de história e futuras revisões oportunas.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Oscar 2010: O Maior Prêmio do Cinema Mundial Anuncia Seus Indicados

As indicações para a 82ª cerimônia de premiação do Oscar da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, o maior prêmio do cinema mundial, reúnem tantos bons filmes e superproduções que fica difícil arriscar qualquer palpite sobre quem irá levar a estatueta de Melhor Filme. Apesar da grandiosidade da produção da maior bilheteria de todos os tempos, Avatar, ao passar a linha dos US$ 2 bilhões de arrecadação até o momento, Guerra ao Terror, segundo observadores e especialistas, pode levar o principal prêmio da noite.

Este ano o Oscar resolveu mudar e pela primeira vez desde 1943 indicou nada menos do que 10 títulos para o prêmio de melhor filme. Com tantos filmes bons seria injusto tirar um deles da disputa e a decisão pela mudança foi muito bem pensada. Os indicados são Avatar, Um Sonho Possível, Distrito 9, Educação, Guerra ao Terror, Bastardos Inglórios, Preciosa, Um Homem Sério, Up - Altas Aventuras e Amor sem Escalas. Eu particularmente esperava ver o filme 2012 nessa lista, uma vez que, assim como Avatar, chegou aos cinemas como uma das mais esperadas produções do ano, com um marketing tão poderoso quanto o favorito.

Se há algum sinal sobre quais deles podem ser considerados favoritos, vale a pena dar uma olhada no prêmio de melhor direção. James Cameron (Avatar), Kathryn Bigelow (Guerra ao Terror), Quentin Tarantino (Bastardos Inglórios), Lee Daniels (Preciosa) e Jason Reitman (Amor sem Escalas) reforçam suas produções na disputa. Mas o melhor será se resguardar de tal tarefa e deixar isso para as cartomantes e os críticos mais ousados. Uma nota interessante nesse time é ver marido (James cameron) e mulher (Kathryn Bigelow) dividirem a ponta da lista das opinões sobre quem vai ser o vencedor, tanto em filme quanto em direção.

Ainda lendo as entrelinhas hollywoodianas, podemos arriscar aqui alguns palpites um tanto quanto inevitáveis e certos, como o favoritismo de Up - Altas Aventuras ao prêmio de melhor longa de animação, já que o filme figura entre os 10 indicados para o prêmio de melhor filme. Há filmes muito menos cotados ao prêmio e certamente entraram na lista por alguma razão que a própria razão desconhece, como Um Sonho Possível, Educação e Um Homem Sério. É possível que, no caso de Um Sonho Possível o nome de Sandra Bullock, que disputa o prêmio de melhor atriz, tenha sido a razão do filme entrar na lista dos melhores do ano. Mas não acredito que os jurados tenham votado no filme com algum nível de sobriedade confiável.

Nessa categoria Sandra Bullock disputa diretamente o prêmio com Meryl Streep (Julie & Julia) e Mulligan (Educação) e a estatueta não ficar com alguém além dessas três favoritas. Também foram nomeadas a novata Gabourey Sidibe (Preciosa) e Helen Mirren, por interpretar a mulher de Leo Tolstói em The Last Station. Quanto às indicações para melhor ator, quatro dos indicados eram esperados: Jeff Bridges (Coração Louco), George Clooney (Amor sem Escalas), Colin Firth (A Single Man) e Morgan Freeman (Invictus). Jeremy Renner por Guerra ao Terror completa o time com menos chances.

A categoria dos atores coadjuvantes também traz algumas escolhas garantidas: Matt Damon (Invictus), Woody Harrelson (The Messenger), Christopher Plummer (The Last Station), e Christoph Waltz (Bastardos Inglórios). Correndo por fora Stanley Tucci disputa pela sua interpretação do assassino serial em The Lovely Bones. Na lista das atrizes coadjuvantes Mo'Nique é favorita por seu trabalho em Precisa, e inclui ainda Anna Kendrick e Vera Farmiga (ambas por Amor sem Escalas), Maggie Gyllenhaal (Coração Louco) e Penélope Cruz (Nine).

A seguir lista com os principais indicados:

Atriz Coadjuvante
Vera Farmiga, por Amor sem Escalas
Anna Kendrick, por Amor sem Escalas
Penélope Cruz, por Nine
Maggie Gyllenhaal, por Coração Louco
Mo´Nique, por Preciosa

Ator Coadjuvante
Matt Damon, por Invictus
Woody Harrelson, por O Mensageiro
Christopher Plummer, por The Last Station
Christoph Waltz, por Bastardos Inglórios
Stanley Tucci, por Um Olhar do Paraíso

Melhor Atriz
Sandra Bullock, por Um Sonho Possível
Helen Mirren, por The Last Station
Carey Mulligan, por Educação
Meryl Streep, por Julie & Julia
Gabourey Sidibe, por Preciosa

Melhor Ator
Jeff Bridges, por Coração Louco
George Clooney, por Amor sem Escalas
Colin Firth, por Direito de Amar
Morgan Freeman, por Invictus
Jeremy Renner, por Guerra ao Terror

Melhor Diretor
James Cameron, por Avatar
Kathryn Bigelow, por Guerra ao Terror
Quentin Tarantino, por Bastardos Inglórios
Lee Daniels, por Preciosa
Jason Reitman, por Amor sem Escalas

Roteiro Original
Guerra ao Terror
Bastardos Inglórios
O Mensageiro
Um Homem Sério
Up - Altas Aventuras

Roteiro Adaptado
Distrito 9
Educação
In The Loop
Preciosa
Amor sem Escalas

Melhor Filme Estrangeiro
Ajami (Israel)
o Segredo dos Seus Olhos (Argentina)
A Teta Assustada (Peru)
O Profeta (França)
A Fita Branca (Alemanha)

Melhor animação
Coraline
O Fantástico Sr. Raposo
A Princesa e o Sapo
The Secret of Kells
Up - Altas Aventuras

Melhor filme
Avatar
Guerra ao Terror
Um Sonho Possível
Distrito 9
Educação
Bastardos Inglórios
Preciosa
Um Homem Sério
Up - Altas Aventuras
Amor sem Escalas

Melhor Fotografia
Avatar, de Mauro Fiore
A Fita Branca, de Christian Berger
Harry Potter e o Enigma do Príncipe, de Bruno Delbonnel
Guerra ao Terror, de Barry Ackroyd
Bastardos Inglórios, de Robert Richardson

Melhor Direção de Arte
Avatar, de Rick Carter, Robert Stromberg e Kim Sinclair
O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus, de Anastasia Masaro, Dave Warren e Caroline Smith
Nine, de John Myhre e Gordon Sin
Sherlock Holmes, de Sarah Greenwood e Katie Spencer
The Young Victoria, de Patrice Vermette e Maggie Gray

Melhor Figurino
Brilho de uma Paixão, de Janet Patterson
Coco Antes de Chanel, de Catherine Leterrier
O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus, de Monique Prudhomme
Nine, de Colleen Atwood
The Young Victoria, de Sandy Powell

Melhor documentário Burma VJ
The Cove
Food, Inc.
The Most Dangerous Man in America - Daniel Ellsberg and The Pentagon Papers
Which Way Home

Melhor efeitos especiais
Avatar
Distrito 9
Star Trek

Só uma questão política ainda não revelada ou um surto acadêmico explicaria a ausência do filme 2012 nessa categoria. É um espanto que um filme com a arrecadação de 2012, US$ 225 milhões só no primeiro final de semana de exibião, tenha ficado simplesmente esquecido em categorias nas quais o filme deveria brigar pela estatueta. Seria honesto incluí-lo nas listas até por respeito ao público! Mas o Oscar há muito deixou de ser uma premiaçlão previsível. A 82ª edição do Oscar será realizada no dia 7 de março, no Teatro Kodak, em Hollywood, com transmissão para mais de 200 países.

sábado, 30 de janeiro de 2010

Uma Lição de Respeito

Onde Fica a Casa do Meu Amigo ? do diretor iraniano Abbas Kiarostami é um desses filmes em que percebemos o quanto o respeito ao outro, cumprido às últimas consequências, é um ato isolado, notável e raro de se ver hoje em dia. Falamos de compromisso, responsabilidade, assistência, civilidade. Mas tudo soa utópico quando vemos na realidade a prática desses valores. O filme de Kiarostami mostra, entretanto, que, ao se tentar exercer a humanidade, ganhamos muito mais com as experiências que vivemos no caminho trilhado com essa intencionalidade do que propriamente no ato humanitário em si.

O que pode nos motivar o exercício do respeito certamente tem origem no grau de compromisso e responsabilidade para com o outro que utilizamos na prática. A evolução da consciência passa não apenas pela compreensão do que é importante para o outro, mas sobretudo pela conscientização do nosso papel nesse processo. No filme, Ahmed leva por engano o caderno do amigo para casa, impossibilitando-o a fazer a tarefa pedida pelo professor. Como o amigo já havia sido advertido pelo professor que, caso não trouxesse a tarefa pronta no dia seguinte, seria expulso da sala, Ahmed se viu com a incumbência de levar o caderno para o amigo. Uma tarefa simples se ele soubesse onde o amigo morava.

O pouco que Ahmed sabe sobre o amigo não vai facilitar nem um pouco a tarefa de lhe entregar o caderno. Contra a vontade da mãe, o menino parte para a cidade vizinha à procura de Nematzadeh, seu colega de classe. Então, é possível perceber, até com certa surpresa, e muitas vezes, reconheço, com um certo encanto, como a boa intenção é redentora e, sempre, recompensadora. Enquanto procurava o endereço do amigo, vemos que pouco importa a procura em si, e sim os passos que precisamos dar numa assistência sincera e o aprendizado que o ato envolve, independente da chegada.

Quando Ahmed chega na cidade vizinha, onde supostamente Nematzadeh mora, a camera de Kiarostami faz lembrar os enquadramentos de Charles Shultz, onde apenas o menino é importante na tela. Isso fica claro quando os três primeiros encontros nas ruas. O primeiro é com um velhinho que carrega palha, mas cujo rosto não vemos. A impressão é que o menino está conversando com um monte de palha ambulante. Em seguida, uma toalha cai da varanda de uma das casas. Uma voz de mulher adulta pede para que o menino a jogue de volta. Por fim, ele encontra um outro colega de turma, que tampouco sabe onde Nematzadeh mora, mas que, aqui, sabemos porque o menino reclama na sala de aula de dores nas costas: ele ajuda o pai no trabalho, carregando pesadas latas de leite. O que nos remete a temas recorrentes no Brasil sobre crianças trabalhando numa época da vida em que deveriam se preocupar exclusivamente com os estudos.

Numa de suas idas e vindas à cidade vizinha à procura do amigo, Ahmed encontra o avô. No segundo diálogo que o menino tem com um adulto da família na sua peregrinação assistencial, o primeiro foi com a sua mãe em casa antes de sair para entregar o caderno, o diretor Kiarostami mostra uma significativa diferença de valores. O idoso, como a sua mãe anteriormente, tenta tirá-lo do seu caminho minizando a tarefa do neto devolver o caderno para o amigo, sob o pretexto de que o menino fosse buscar os seus cigarros em casa. Enquanto Ahmed vai buscar os cigarros em casa, a camera se fixa no avô. Então, vemos que, para o idoso, o ato de respeitar passa pelo uso da violência como forma de intimidação aos membros menores da família. Numa de suas falas, ele diz que seu pai lhe batia a cada quinze dias, não porque tinha um bom motivo para isso, mas porque tinha que manter a imposição do respeito pelo temor.

Na mesma sequência, Ahmed não se faz ouvido pelos adultos. Ele procura ajuda com um vendedor de portas que não lhe ouve, mas que ao saber se tratar do pai de Nematzadeh, segue o homem de volta à cidade vizinha. Lá, infelizmente, descobre que o filho dele também se chamava Nematzadeh, mas não era o amigo de sala de Ahmed, e tampouco o conhecia em Koker. Certamente Kiarostami, que não disperdiça sigmas em seus filmes, nos mostra um caminho em S no morro que liga as duas cidades - S de Sísifo, que, na mitologia grega, foi condenado a carregar uma pedra ao alto de um morro para vê-la rolar de volta à base por toda uma eternidade. A procura pelo amigo era, seguramente, um trabalho de Sícifo para aquele menino !

O último encontro que Ahmed tem no povoado vizinho está cheio de significados. Em suas várias viagens à Koker, já perto do pôr do sol, ele encontra o velhinho marceneiro. No filme, o personagem representa a sabedoria, a cultura e a tradição. Caminhando com o menino, ele mostra orgulhoso a cidade como uma de suas obras. Sábio, ele tem uma fala mansa e caminha lentamente, desfrutando de cada palmo da localidade, enquanto o menino caminha rápido, sempre com pressa e quase sem olhar em volta, tentanto vencer o tempo e demonstrando impaciência com o lento. Na medida em que o velho sábio sabe por onde anda com seus passos lentos, o menino está perdido e sem direção em seus passos rápidos. Logo em seguida, ele se desgarra do velho, mas esbarra no medo dos latidos de um cão e pára. É quando o velho o alcança e o reconforta. Sublime interpretação do diretor para a sabedoria dos experientes diante da impetuosidade dos jovens que ainda têm muito o que aprender com a vida.

Terminando o dia, Ahmed está de volta à sua casa. Derrotado por não ter encontrado a casa do amigo, ele sofre, recusa a comida que a mãe lhe serve, está pensativo, triste e isolado em seu universo de frustração. Mas, ao invés de, apesar de exausto, ir dormir, vai fazer a sua tarefa. Abre os dois cadernos e atravessa a noite fazendo os exercícios em duplicidade. Na manhã seguinte na sala de aula, o colega Nematzadeh já se sente perdido por não ter feito os exercícios, quando o professor começa a revista nos cadernos dos seus alunos. Quando o professor está por revistar o caderno de Nematzadeh, Ahmed chega atrasado na sala de aula. Ele se senta junto ao colega e, discretamente, lhe entrega o caderno. É quando o professor se aproxima e faz a revista. Ao abrir o caderno de Nematzadeh vê que todos os exercícios haviam sido feitos e que, na última página, Ahmed havia colado uma flor, que ele colhera no caminho para Koker, símbolo de suas viagens para encontrar o amigo no dia anterior.

Onde Fica a Casa do Meu Amigo ? deixa várias reflexões como tarefa de casa para o espectador. A mais significativa delas, entretanto, creio que seja sobre os valores da sociedade. No filme, o menino encontra muitos adultos incapazes de entender suas necessidades imediatas e lhe mostrar o caminho certo para alcançar aquilo que ele precisa. Além disso, fica claro que todo aprendizado importante ocorre fora das instâncias da educação formal e familiar. Vemos um professor que aterroriza seus alunos com ameaças e humilhação, uma mãe e um avô que despreza a atitude do menino de cumprir com sua responsabilidade para com o colega de turma, um pai ausente, e tudo que os adultos fazem é deseducar, passar ensinamentos totalmente descontextuados da realidade da criança, que, por sua vez, de forma perseverante, nos mostra que a vida não deve ser uma imitação engessada de uma tradição retrógada, mas uma experiência individual que jamais deve ser levada de qualquer jeito.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Série Tributo: Volume 1 - Andrei Tarkovsky

Tributo ao premiado e aclamado diretor russo, Andrei Tarkovsky (1932-1985), que se tornou uma lenda do cinema após a realização de obras primas como Solaris, O Sacrifício, O Espelho, Andrei Rublev, Stalker, Nosthalgia e A Infância de Ivan.

Ele dirigiu os primeiros cinco filmes de sua filmografia de sete filmes na antiga União Soviética. Os dois outros foram feitos na Itália e Suécia. Tarkovsky se caracterizou por fazer filmes com grande intensidade dramática, personagens misteriosos, temas metafísicos, histórias carregadas de espiritualidade e reflexões filosóficas. Sua técnica muito particular explorava longas tomadas, movimentos lentos de camera e quadros expostos numa fotografia muitas vezes surreal e pictórica. Nada em seus filmes parece convencional e a estrutura dos seus plots ficou conhecida por apresentar uma cinematografia memorável.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Série Entrevistas - Volume 2: Jean-Luc Godard


Entrevista realizada com Jean-Luc Godard para televisão francesa.


domingo, 24 de janeiro de 2010

Aniversário de 1 Ano do Blog Cinema & Consciência

O Blog Cinema & Consciência fez um ano de existência no último mês de dezembro de 2009. Em tempo, gostaria de agradecer a todos os seguidores e também aos visitantes por manter o fluxo de informação sempre em movimento. Muito obrigado a todos !

Pais Desequilibrados, Filhos Condenados


Alienação parental é o ato do genitor ou genitora, após a separação conjugal, afastar os filhos do ex-companheiro (a), com a intenção de desgastar a imagem e desacreditá-lo (la) moralmente diante dos filhos. Os interesses são inúmeros, como limitar o contato da criança não apenas com o genitor(a) alienado, mas também com toda a família dele ou dela, fazer a criança pensar que foi abandonada e, portanto, rejeitada, pressionar a criança para escolher entre um genitor e outro, criar a impressão de que o genitor(a) alienado é perigoso, evitar mencionar o nome do genitor(a) alienado dentro de casa ou qualquer comentário relativo a ele ou ela, desvalorizar hábitos, costumes, idéias, lembranças, gestos, amigos e parentes do genitor (a) alienado, entre muitos outros.

A estratégia empreendida pelo pai ou mãe alienador não é só maldosa e desonesta para com o ex-companheiro(a) e cruel para com os filhos, pelo alto grau de egoísmo na razão do alienador, como também extremamente ardilosa, por utilizar técnicas e táticas complexas de destruição da imagem e afastamento dos filhos que, obviamente, são os maiores prejudicados. Mas o pai ou mãe alienador está imbuído demais em investir em punições a ex-companheiros(as) e a pôr em práticas seus planos diabólicos, movido por satisfações malévolas e arroubos de um ego estragado e uma mente emocionalmente desequilibrada, para enxergar a verdade além de si mesmos e entender a separação de uma maneira menos revanchista. Para resgatar o que ele ou ela entende equivocadamente por amor próprio e dignidade, ele ou ela não hesitará em usar os filhos como escudo.

A alienação parental é um ato de covardia que desafia até a determinação da justiça, que dá ao ex-companheiro(a) o direito de ver os filhos depois da separação. Para a criança, a visita do pai ou da mãe pode lhe causar alguns dissabores após o encontro, como punições veladas caso a criança expresse satisfação em ver o pai ou a mãe na visita, conflitos com o pai ou mãe alienador, interrogatórios após as visitas, terrorismos subliminares, culpas caso a criança tenha um bom relacionamento com o pai ou a mãe alienado. E os efeitos de uma mente doentia não ficam por aí. Na convivência diária, é comum o pai ou a mãe alienador investir na reeducação parental dos filhos muitas vezes obrigando-os a chamar de pai ou mãe o padrasto e a madrasta, além de forçá-los a usar o primeiro nome ao se referir ao pai ou mãe biológico.

O contato da criança com o pai ou mãe alienado se torna um tormento. Telefonemas, cartas, e-mails, ou qualquer outro tipo de correspondência se torna insistentemente fiscalizado e uma verdadeira administração de ditadura se instala na casa do alienador. As visitas são monitoradas, rigidamente controladas e, em alguns casos, maldosamente abreviadas. A fantasia criada com o intuito de destruir a imagem do pai ou mãe alienado é tão forte e desonesta que muitas vezes, já grandes, quando os filhos descobrem a verdade sobre seus pais ou mães biológicos, prejudicados pela alienação, é comum haver rompimentos de relação com o pai ou mãe alienador, tal é a revolta sentida pelos filhos, gerada por anos de enganação e sofrimento.

O documentário A Morte Inventada é um belo trabalho do diretor Alan Minas, que revela o drama de pais e filhos que tiveram seus elos rompidos por uma separação conjugal mal conduzida. Os pais testemunham seus sentimentos diante da distância por anos de afastamento de seus filhos. Os filhos que na infância sofreram com esse tipo de abuso revelam de forma dramática como a alienação parental interferiu desastrosamente na sua vida, na sua formação como pessoa e em seus relacionamentos sociais, além de como a prática afetou a relação com o genitor ou genitora alienado. Vingança, revanchismo, infantilismo, baixa auto-estima, problemas de ego, entre outros distúrbios, são as causas mais comuns da alienação parental.

Segundo o psiquiatra infantil americano, Richard Gardner, a alienação parental revela-se como um situação na qual o genitor ou genitora alienador tenta afastar os filhos dos ex-companheiros por motivos egóicos e através de informações distorcidas, normalmente extrapolando o limite da realidade ao ponto de criar acusações severas de abuso sexual a fim de romper de uma vez por todas, apoiados em decisões judiciais, o vínculo dos filhos com o pai ou a mãe alienado. O alienador usa os filhos para atingir o ex-companheiro(a) como punição pela separação. Os casos de alienação crescem quando a separação ocorre pela escolha de um dos conjuges de casar-se com outra pessoa ou quando a separação ocorre por infidelidade. As crianças vítimas da alienação parental carregam para sempre os sinais desse tipo de violência, podendo desenvolver, na fase adulta, distúrbios psicossociais severos.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Um Mar de Maturidade

O processo da maturidade pode ser explicado através de várias asserções, mas não seria exagero afirmar que os efeitos da verdadeira maturidade implicam o uso predominante da razão e do senso crítico, a maneira com que controlamos as emoções e o grau de inteligência evolutiva que aplicamos na prática. O processo da maturidade é relativo a cada ser humano e se desenvolve de forma complexa, de acordo com a percepção que temos do meio em que vivemos e através do entendimento das nossas responsabilidades individuais, o que também envolve o conhecimento das nossas capacidades, fraquezas e limites.

No livro Humano Demasiadamente Humano, Nietzsche afirma, "quem quiser seriamente (alcançar a maturidade) perderá de mais a mais, sem qualquer constrangimento, a propensão para os erros e vícios; também a irritação e o aborrecimento o acometerão cada vez mais raramente. É que a sua vontade não quer nada mais instantaneamente do que conhecer e o meio para tanto, ou seja, a condição permanente em que ele está mais apto para o conhecimento."

A maturidade humana não está necessariamente condicionada à qualquer questão cronológica - experiência sem consciência de nada serve - e é justamente nesse ponto que o filme da diretora Marion Hänsel, Entre O Inferno e O Profundo Mar Azul, desce suas âncoras para nos mostrar uma bela história de amizade, aprendizado humano e interassistência na prática. Em Diário, Delacroix diz que "a posição em que a idade nos coloca é uma ironia da natureza."

O filme conta a história de Nikos, um homem infeliz, atormentado pelo seu passado, perdido e viciado em ópio, cujo navio está ancorado no porto de Hong Kong à espera de um comprador, e Li, uma garotinha pobre, mendiga, que parece embarcar diariamente em navios estrangeiros atracados à procura de comida, dinheiro e trabalho, o que, por fim, acaba conseguindo no navio de Nikos.

Li tem 10 anos e vive com os avós, num barquinho que circula no porto de Hong Kong, como parece circular outros barcos como aquele, usados como moradias pelo pobres locais. Sobre a família de Li sabemos que o pai abandonou a mulher e os dois filhos pequenos, ficou cego e vive numa espécie de asilo ao ar livre. Ela e o irmão foram então abandonados pela mãe, por ordem de um padrasto que os rejeitava. Nikos não conta muito sua vida, mas o pouco que sabemos é suficiente para sabermos que ele é um homem atormentado por uma relação mal acabada com uma mulher na Bélgica, que lhe escreve cartas nunca respondidas por ele e que, entre outras lamentações sobre o destino que os separou, lhe fala de um filho que ele nunca viu. Fica claro que a vida de Nikos está num barco à deriva, como o navio em que trabalhava e que agora está à venda. Desesperançado e sem brilho, ele sobrevive no navio como um vegetal, cercado de homens igualmente perdidos com o fim das viagens, que gastam o tempo em jogatinas, bebedeira e mulheres.

Num cenário nada reconfortador, a presença de Li e seu irmão pequeno traz um filete de esperança e sorriso para os marinheiros. Além da dupla de crianças, um bichano ainda filhote é resgatado e adotado pelo capitão do navio. Na interpretação do título, a realidade desesperançosa do navio nas primeiras cenas do filme mostra o inferno pessoal em que vivem seus ocupantes naquela última estadia, atenuada aos poucos com a chegada do gatinho e das crianças. Nesse universo triste e terminal, Li vai sobriamente conquistando seu espaço e literalmente limpando o navio e lavando roupas sujas. Na limpeza do lugar, sua amizade com Nikos ganha um nível maior de companheirismo e uma afetividade improvável para um homem em tal imersão de tristeza.

Quando ele a convida para ir à cidade, a história mostra a saída do inferno para algo mais humanamente digno. É quando Li passa a exercer, com uma naturalidade inviolável e uma maturidade assombrosa, sua capacidade assistencial. A menina o leva a conhecer o local em que viveu, visita a mãe na fábrica em que trabalha como escrava e assoitada pelo marido e depois o apresenta o pai no asilo. A maneira com que Li frequenta seu passado, assiste seus pais e revisita um tempo que muitos preferiam esquecer, é uma lição de vida e esperança para Nikos, que, em um dos diálogos mais marcantes do filme, diz à menina, "você ajuda sua mãe, ajuda seu pai, ajuda seu irmão e sua família, e ainda está me ajudando ?" A menina olha para ele com muita tranquilidade e responde, "a vida não pode se diferente."

O roteiro de Entre o Inferno e O Profundo Mar Azul é uma adaptação de um conto chamado "Li", do escritor e poeta grego Nikos Kavvadias (1910-1975). O filme é sublime, com a intenção de mostrar não apenas que maturidade e idade adulta não necessariamente devem pertencer à mesma pessoa, mas, sobretudo, que, ao tentar enxergar o macro na assistência ao outro, deixamos de compreender o micro, sem o qual o macro perde todo o sentido. O problema não reside, entretanto, na nossa busca incessante pelo ideal, posto que está é uma das inquietudes humanas necessárias, mas na direção em que olhamos para encontrar esse ideal. Ele não estará no que é concreto.

O filme infelizmente não ganhou um lançamento em DVD, apesar de ter sido lançado em 1995, e está disponível apenas em fitas VHS.




Casting No Shadow (1991) - Wim Mertens (da trilha sonora do filme Entre o Inferno e O Profundo Mar Azul)

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

A Indústria do Medo

Assistindo O Mistério da Duas Irmãs ontem, o que aproveito para recomendar o filme, que é uma mistura muito bem dosada de suspense, drama psicológico-psiquiátrico e ghost movie, me dei conta de que os filmes do gênero têm a clara intenção de assustar o espectador. Tanto em cenas as mais banais quanto naquelas em pontos-chave da película, o medo pontua o gráfico dramático como se nos desse a ordem 'agora é hora de pular da cadeira.' Isso é irritante e em muitas partes do filme, desnecessário. Segundo normas supostamente estabelecidas nos roteiros, é padrão seduzir o espectador para um susto num terço da fita, outro susto num segundo terço e pisar no acelerador dos sustos no último quarto de tempo do filme, criando então um final chocante. Para dar um bom susto é preciso criar um ambiente prévio de aparente tranquilidade, relaxando o espectador antes de fazê-lo pular da cadeira. Quanto mais tranquila for a cena que leva ao susto, maior será o pulo da cadeira. Veja esse filme de uma propaganda de carro, por exemplo.



Entenderam ? Esse é o segredo de um bom susto. O medo ajuda o homem a evitar o perigo. Ele aumenta a eficiência do organismo. Logo que o cérebro percebe uma ameaça, o circuto do medo é acionado. Formado por núcleos cerebrais como a amígdala e o hipocampo, ele libera neuro-hormônios e neurotransmissores em defesa do organismo. Dopamina, endorfina e adrenalina caminham para o sangue. No alívio, quando o perigo é detectado e vencido, o cérebro desativa sua defesa e suspende a produção das substâncias. A alta do dopamina deixa deixa os sentidos alertas, proporciona ao mesmo tempo sensação de prazer e calma. Os intervalos de sustos nos filmes obedecem aos fluxos de produção da dopamina no cérebro. Quando em alta, o efeito é melhor e até vicia, posto que sempre buscamos esse tipo de prazer. Como acontece com os praticantes de esportes radicais. As atividades que geram maior perigo são as que produzem maior prazer - essa conclusão médica deve ser seguida, no entanto, da seguinte observação: maior prazer para aqueles que usam sua dopamina com uma certa tendência suicida.

Mesmo tendo vencido seus medos mais primitivos, como o de ser devorado por animais predadores, entre outros ao longo da história, o ser humano possui uma imaginação infinita para criar novos pavores de acordo com o pensamento atualizado de uma geração. Criou-se o medo dos bárbaros, das bruxas, dos monstros, dos vampiros, das pestes, dos marcianos, dos comunistas, dos ataques nucleares, das guerras, do George Bush, do Osama bin Laden etc. Cultura, sociedade e educação são os pilares na determinação dos medos do povo. O medo controlado na tela, com a certeza de que tudo aquilo não é real, e que a realidade tal como nós conhecemos estará nos esperando ao final da sessão, faz com que o público se permita algumas horas de pavor e sinta prazer nisso. O ser humano busca por instintos emoções fortes, seja em filmes de terror ou aventura ou em esportes radicais, de modo que podemos certamente asseverar que, um bom filme de terror é o mesmo que saltar de asa delta da Pedra da Gávea ou se lançar em queda numa Montanha Russa.

Essa predileção pelo prazer no risco ou no lado angustiante do terror tem explicação no lado cultural, psicológico e social do medo, um componente essencial na vida humana. O filósofo Aristóteles resolveu definir o efeito esperado da tragédia quando disse que "devia provocar no público a catarse, por meio da piedade e do terror." Só assim o público conseguiria purgar seus conflitos interiores e se arrepender dos seus pecados. As cenas horripilantes da mitologia grega, como a de Prometeu, Édipo, Sícifo, entre outros, tinham a intenção de fazer o povo depurar seus próprios sentimentos. E, hoje, o principal dispositivo da arte é fazer o público viver experiências que não seriam possíveis no mundo real. Filmes de monstros e fantasmas, então, são os melhores para deixar vir à superfície o lado obscuro tanto do ser humano, quanto da realidade em que vive. Bem, isso é de certa forma lamentável, porque, aqui, a arte pouco pode fazer para evitar a realidade fora das salas de cinema.

A concepção artística da realidade, retratada nas telas, cria uma suposta imagem quimérica para o mundo sobrenatural, dando a entender que a paranormalidade é uma invenção só vista na indústria cinematográfica. Desde a infância, somos educados a temer o desconhecido, o sobrenatural, o paranormal, as criaturas do além, fantasmas e espíritos, tendo a religião como base na criação deste medo. A convivência pacífica com o dom da clarividência é simplesmente impensável. A comunicação multidimensional pode ter levado muitos ao manicômio. A paranormalidade inata, natural e sadia é uma coisa para se guardar a sete chaves e temer sobre todas as outras coisas. Ironicamente não fomos feito para saber quem de fato somos nem para compreender completamente o espaço em que vivemos. O restringimento físico é sábio, posto que respeita nossa condição anímica de limitações e ignorâncias.

Com a maturidade, podemos ir, pouco a pouco, nos libertando dos grilhões das lendas urbanas e dos mitos religiosos seculares, os quais fundamentaram as bases do sentir medo de espíritos. Embora não seja uma tarefa nada fácil, quando estivermos preparados para enxergar a vida através de uma lente grande angular, veremos o quanto deixamos de evoluir por temer a nós mesmos, numa outra dimensão.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Apartheid Alienígena

Particularmente não tenho nada contra alienígenas. Muito pelo contrário. Todos os que eu conheci eram superdotados, energeticamente poderosos, educados, assistenciais e queriam sossego para ambos os lados. Vinham em missão de paz e para a melhoria intelectual da raça humana. Não estacionavam naves em campos de trigo, não cegavam militares com luzes incandescentes, não apareciam em Globo Repórter nem em fotos suspeitas como pratos voadores cintilantes, sobrevoando florestas e cidades e assustando populações inteiras de desavisados. Não tinham forma de ácaros humanóides, nem de bactérias disformes. Não expeliam gosmas amarelas, não degulinavam feito moluscos fora d'água e tampouco se plasmavam em monstros aberrantes. Não falavam por códigos indecifráveis, nem emitiam sons metálicos. Claro que esperar ver um deles numa fila de supermercado seria uma alucinação errática. Mas todos aqueles com quem estive são criaturas tão simpáticas e bem intencionadas com quem podemos passar normalmente um bom tempo conversando ao pé da cama ou em qualquer outro local onde haja alguma privacidade. De modo que seria um exagero desejar que fossem todos enviados de volta para o espaço ou isolados em distritos favelados vasculhando lixos, pois, convenhamos, uma nave capaz de cruzar o espaço e estacionar na Terra deve ter lá seu valor e uma inteligência extra-terrestre. Se nos julgamos superiores e ainda não consegumos dominar a lua, esses caras devem ser todos uma versão atualizada do Stephen Hawkins !

Falar de alienígenas com naturalidade é o que há de mais original em Distrito 9, o filme que deixei de ver nos cinemas, mas que agora consegui em DVD - lançado lá fora. No filme, a humanidade esperava por um ataque hostil ou por gigantes avanços tecnológicos, mas nada disso veio. Os alienígenas chegam à Terra como refugiados e se instalam em uma área da África do Sul, o tal Distrito 9, enquanto os humanos decidem o que fazer com eles. A Multi-National United (MNU) é uma empresa contratada para controlar os alienígenas e mantê-los em campos de concentração e deseja receber imensos lucros para fabricar armas que tenham como matéria-prima as defesas naturais dos extraterrestres. Mas a MNU falha na tentativa de fabricação das armas e descobre que, para que elas sejam ativadas, o DNA dos aliens é necessário. A tensão entre humanos e aliens aumenta quando Wikus van der Merwe contrai um misterioso vírus que modifica o DNA dos humanos transformando-os em aliens. O fato acaba impedindo a poderosa MNU de colocar em prática seus planos de exploração sobre as criaturas de outro planeta. Então o homem que se torna o mais procurado do mundo, tem que fugir, mas sem casa e sem amigos, só tem um lugar onde se esconder: o Distrito 9.

O filme oferece alguns pontos de reflexão interessantes. O primeiro é ver como nossa peculiar forma de lidar com as diferenças extrapola os limites do absurdo e fere o conceito de universalismo. Não acredito que tais criaturas seriam fadadas a viver precariamente numa favela no Soweto sulafricano se todos tivesem a forma humanóide americana ou fossem parecidos com a Gisele Bündchen. Segundo é constatar que tudo, em se tratando de intolerância contra minorias, acaba em guerra de nossa parte, já que os alienígenas deixaram bem claro sua missão pacífica. Terceiro toca a questão do preconceito. O movimento popular de reprovação e luta armada para a expulsão de tais elementos intergalácticos mostra como os alienígenas, na verdade, somos nós. Quarto, o filme explora a condição humana de exploração imperialista em busca de lucros e poder, remanescente do tempo das navegações em caravelas. Como não creio que haja uma história inédita a ser contada no cinema, a originalidade de Distrito 9 é o grande diferencial desta produção de 30 milhões de dólares, que se pagou com apenas três dias em cartaz, arrebatando platéias no mundo todo e encantando a crítica.

Com produção assinada por Peter Jackson, famoso pela trilogia de Senhor dos Anéis, o jovem diretor Neill Blomkamp criou um clima de filme-documentário muito eficiente (a velha nova moda no cinema desde que a Bruxa de Blair foi lançado). E é justamente nesse pique de documentário que o filme ganha mais alguns pontos em sua escala de interesse. A produção foi acompanhada ainda por uma pesada campanha publicitária em estilo realista, com cartazes espalhados por cidades americanas, pedindo para denunciar aliens e mantê-los à distância. Muitas das entrevistas mostradas no filme são bem reais e falam de uma África do Sul que vai além da relação com o apartheid. Blomkamp entrevistou sul-africanos pobres de Soweto sobre o que eles achavam dos "illegal aliens", que, em inglês, significa tanto "alienígenas ilegais" como "imigrantes ilegais". Como não sabiam do filme, os entrevistados soltavam o verbo contra os zimbabuanos que passaram a imigrar em massa para a África do Sul nos últimos dez anos, fugidos da ditadura de Robert Mugabe e povoando as favelas do país vizinho. Além dos zimbabuanos, os nigerianos também entraram na dança no Distrito 9 como traficantes religiosos. No filme, eles surgem como selvagens canibais de aliens, embora quem tenha se sentido ofendido sejam os sul-africanos, já que os nigerianos são interpretados por atores locais, que falam dialetos negros sul-africanos.

Ficção científica nunca foi para mim um gênero que merecesse muita atenção. Mas Distrito 9 ganha nessa boa onda de tratar histórias banais de uma forma diferente e original. Assim vimos em Os Outros, Deixe Ela Entrar, A Bruxa de Blair, Borat, September Tapes, Gothic, filmes de genêros os mais variados.



quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Série Entrevistas - Volume 1: Woody Allen


Entrevista com Woody Allen realizada pela Revista TIME americana.


quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Em Cartaz: Destaques da Crítica e do Público


500 Dias com Ela


Tom (Joseph Gordon-Levitt) é um jovem tímido e sem jeito com as mulheres. Formado em arquitetura, ele leva a vida elaborando frases para uma empresa que edita cartões de felicitação. Inteligente, mas acomodado, não vislumbra grandes rumos em sua vida. Até conhecer Summer (Zooey Deschanel), sua nova colega de trabalho, recém-chegada de Michigan, por quem se apaixona perdidamente. Ele faz de tudo para conquistá-la, mas ela não está muito interessada em relacionamentos sérios.

Indicado ao prêmio Globo de Ouro de 2009 nas categorias Melhor Filme (Musical ou Comédia) e Melhor Ator (Musical ou Comédia) com Joseph Gordon-Levitt.

"A paixão arrebata, consome. Tom Hansen se entrega a Summer Finn, prevendo seu futuro naqueles olhos enigmáticos. Para cada situação passada juntos, ele imagina uma música, como se a vida fosse um imenso video-clipe coreografado e com final feliz. Mas é ingenuidade esperar por um final feliz. Summer abandona Tom antes. A canção então diminui as rotações, fica triste. A expectativa não se confirma, e o mundo de Tom desaba." André Miranda - O GLOBO




À Procura de Eric

Eric Bishop (Steve Evets) é um jovem carteiro fanático por futebol descontente com a vida que leva. Casado há 30 anos com Lily (Stephanie Bishop), por quem já foi apaixonado, não consegue enfrentá-la nem controlar seus enteados. Apesar de tentar escapar dessa rotina sufocante, ele só consegue alguns momentos de tranquilidade quando acende um baseado e começa a receber conselhos de seu grande amigo, o ex-jogador de futebol Eric Cantona.

"Sair do cinema feliz da vida depois de assistir a um filme do britânico Ken Loach? Sim, isso é possível. “Looking for Eric” (no original), roteirizado por Paul Laverty, parceiro das antigas, mantém a pegada e o foco na vida dos excluídos, como nos dramáticos “Meu nome é Joe” e “Terra e liberdade”. Só que é um filme engraçado, de humor refinado, inteligente, no qual o mundo não é visceralmente nublado." Érico Reis - O GLOBO




Deixa Ela Entrar


No subúrbio de Estocolmo, em 1982, Oskar (Kare Hedebrant) é um garoto frágil de 12 anos, que sofre maus-tratos dos colegas na escola e se sente solitário. O que ele mais deseja é ter um amigo. Quando Eli (Lina Leandersson), uma garota séria e pálida, se muda para a vizinhança, esse desejo se concretiza. O problema é que a menina tem hábitos estranhos, só sai de casa à noite e não parece ser afetada pelo frio.

"A princípio, demora um pouco para o público entrar no clima frio e lento (e nórdico) de “Låt den rätte komma in” (no original). Depois, o espectador é totalmente enfeitiçado por este título inovador, provavelmente o mais original filme de vampiros que subvertem o vampirismo desde que o gênero foi criado. Ainda que os sanguessugas sejam uma praga hoje em dia (estão em toda parte, na TV e nos cinemas, em versões diluídas e anêmicas), nada se compara a esta intrigante produção sueca." Tom Leão - O GLOBO





No Meu Lugar


Um policial se vê obrigado a intervir num assalto a uma casa de classe média alta no bairro de Laranjeiras, no Rio. A partir deste evento, o filme acompanha três histórias passadas em tempos diferentes.

Algumas semanas antes, um entregador de compras de um supermercado descobre o amor da sua vida. Dias depois, o policial, suspenso das suas atividades, tenta seguir adiante com sua rotina normal, a vida com sua única filha e a presença dos amigos.

Cinco anos depois, uma mulher volta com seus dois filhos e o novo marido para esvaziar e vender a casa onde morou no seu casamento anterior até a morte do primeiro marido. Estreia de Eduardo Valente como diretor de longa-metragens.

"Os diálogos e o desempenho dos atores (destaque para Raphael Sil, Márcio Vito e Dedina Bernardelli, num elenco preciso) talvez sejam o ponto alto do filme. Mas não é só por causa desses componentes que o Bonequinho está aplaudindo de pé. Em seu promissor primeiro longa-metragem, Eduardo Valente revela perfeccionismo e amplo domínio cinematográfico. Tudo funciona bem no filme." Érico Reis - O GLOBO




Nova York, Eu Te Amo

Reunindo um elenco estelar de Holywood em onze curtas, “Nova York, eu te amo” conta histórias de amor que se passam na cidade que nunca dorme.

Nos moldes de “Paris, te amo”, o longa é um mosaico de olhares tecido por cineastas consagrados, como Fatih Akin, Yvan Attal, Allen Hughes, Shunji Iwai, Wen Jiang, Shekhar Kapur, Joshua Marston, Mira Nair, Brett Ratner, Andrei Zvyagintsev e pela diretora novata, a bela atriz Natalie Portman.

Diversos, mas com o mesmo fio-condutor, os roteiros convidam o público a embarcar no cotidiano íntimo dos nova-iorquinos, descortinando brigas e, especialmente, as constantes buscas pelo amor.

Seguindo o sucesso de seu aclamado predecessor, a nova produção de Emmanuel Benbihy integra a série "Cidades do amor", que em cada filme busca conduzir o público às cidades mais amadas e culturalmente influentes do mundo. As próximas cidades serão Rio de Janeiro e Shangai, em 2010, e Jerusalém e Mumbai, em 2011.

"Filmes reunindo vários episódios dirigidos por cineastas diferentes costumam escorregar nos clichês e apresentar altos e baixos de qualidade. Não é o que acontece com “New York, I love you” (no original). O segundo filme da série “Cities of love”, do produtor francês Emmanuel Benbihy, dirigido por dez diretores, é coeso" Érico Reis - O GLOBO




O Fantástico Sr. Raposo

Baseado no livro "Raposas e fazendeiros", de Roald Dahl. O sr. Raposo (George Clooney) e sua mulher (Meryl Streep) levam uma vida tranquila com seu filho e um sobrinho, até que a rotina começa a pesar e ele não resiste aos seus instintos selvagens. Alguns anos atrás, quando a mulher engravidou, o raposo lhe fez uma promessa: abandonar a vida de malandro, deixar de roubar galinhas e levar uma vida respeitável. Mas a cada dia esse compromisso fica mais difícil de ser cumprido.

Primeira animação de Wes Anderson. Indicado ao prêmio Globo de Ouro de 2009 na categoria Melhor Filme de Animação.

"Quando todos achavam que nenhum estúdio de animação seria capaz de barrar a criatividade da Pixar, um diretor assumiu para si a responsabilidade. Wes Anderson escolheu uma história do escritor Roald Dahl, convocou animadores de stop-motion, reuniu atores do primeiro time e filmou “The fantastic mr. Fox” (no original). O filme talvez tenha sido seu maior acerto." André Miranda - O GLOBO




Avatar


Com roteiro e direção de James Cameron - vencedor do Oscar, em 1998, com o filme "Titanic" -, "Avatar" narra uma batalha futurista em que terráqueos querem explorar Pandora, um planeta habitado pelos Na'vi, uma raça humanóide totalmente desconhecida e de cultura e idioma próprios.
O soldado Jake (Sam Wothington) - um veterano de guerra que ficou paraplégico - é escalado para liderar a operação no local desconhecido e com isso ter a chance de recomeçar na linha de combate.
Durante a missão, o grupo utilizará uma tecnologia completamente inovadora, envolvendo a criação de avatares a partir da mistura de DNA humano e extraterrestre, para aniquilar as criaturas de Pandora. Com exibição em 3-D em algumas salas.

Indicado ao prêmio Globo de Ouro de 2009 nas categorias Melhor Filme, Melhor Diretor (James Cameron), Melhor Trilha Sonora Original e Melhor Canção Original ("I will see you", de James Homer, Simon Franglen e Kuk Harrell)

"Avatar" vende-se como um fliperama, um videogame tridimensional, prometendo elevar a sensibilidade da plateia para além das fronteiras do olhar. Existe um boato de que, na Fox, ninguém deveria se referir ao longa-metragem como uma ficção científica, definindo-o como "um filme de aventura para toda a família" por imposição de seu próprio realizador. Se ele deve ser comercializado assim, vende-se mal: o novo filme do midas que pôs o mundo a suspirar com "Titanic" (1997) alcança patamares muito mais complexos e provocantes do que sua promessa de encanto visual." Rodrigo Fonseca - O GLOBO

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