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domingo, 28 de fevereiro de 2010

A Difícil Arte de Ser o Outro

Colocar-se na posição do outro e compreender sua realidade é uma árdua tarefa. Mas, se ao menos uma vez fosse realizada, nunca mais falaríamos mal de ninguém. Paradoxalmente, tal esforço é justamente o que nos faz crescer como consciência intrafísica. Isso torna a vida mais complexa, de certo. Mas isso já sabíamos. A vida em si não é nada simples como muitos acreditam. Sem uma decente compreensão da realidade à nossa volta, seja quão humilde essa compreensão for, nosso esforço em nos conhecer está comprometido com o insucesso, pois uma grande parte do que somos representa a maneira como nos relacionamos com o mundo exterior. O homem isolado vegeta.

Cao Guimarães apresenta nesse documentário a voz do outro e o resultado surpreende, pois o que se vê é que, ao viver o outro, permitimos uma grande exposição de nós mesmos. Não há como viver a realidade de alguém sem refletir no outro a nossa própria imagem. A versão que podemos a dar a qualquer elemento externo a nós mesmos contém invariavelmente a nossa impressão. É dizer, a nossa visão do outro constrói o outro a partir de nós mesmos. Mas esse jogo é uma via de mão dupla. Na mesma medida em que construímos o outro, somos construídos por ele. Se você recebesse um convite para permitir que um estranho vivesse em sua casa por uma semana, sem ele jamais ter lhe visto antes, que imagem esse estranho faria de você ao final de 7 dias ? Se nossos pertences refletem o que somos, de que forma estamos representados ?

A decoração, a harmonia, as cores, o estilo, a organização, a disposição dos objetos, os próprios objetos, enfim, tudo que temos pode nos desnudar. Isso, obviamente, na dimensão física, pois a energia do ambiente também contém nossas energias vitais como digitais. No documentário de Cao Guimarães isso fica num nível subliminar. Rua de Mão Dupla mostra suas linhas centrais já nas primeiras imagens do filme. Cao Guimarães convidou seis pessoas pertencentes às camadas médias da população, moradores solitários de Belo Horizonte, a participar de uma experiência inusitada: divididos em duplas, eles trocariam de casa por 24 horas e, munidos de uma câmera digital, filmariam o que bem lhes aprouvesse em casa alheia, tentando elaborar uma imagem mental do morador ausente, através da convivência com seus objetos pessoais e seu universo domiciliar. Ao final, dariam um depoimento para a câmera, contando como imaginaram esse morador, ou esse "outro".

O resultado da experiência é bastante interessante por todas as questões explicitadas acima. É fascinante ver como traçamos nossos retratos no que possuímos, no padrão das nossas energias no ambiente em que vivemos (na verdade, e em qualquer um em que estejamos) e como a percepção humana pode ser tão aguçada ao ponto de nos desnudar com um simples olhar em volta, mesmo quando o observador não pode nos ver. O cineasta mineiro Cao Guimarãese soma cinco longas-metragens e algo em torno de 20 curtas, segundo o próprio, mas, infelizmente, tem visibilidade zero entre o público não frequentador de festivais. Cao possui um estilo espirituoso e desafiador e já ganhou aqui um marcador depois de Rua de Mão Dupla.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Tributo aos Grandes Atores

A difícil arte de homenagear é para poucos, pois sempre achamos algum injustiçado ausente do grupo de homenageados. Inevitável. Bem, seja como for, esta montagem de Philip Scott Johnson é uma obra prima. Nela, encontramos sempre algum link de semelhança em Douglas Fairbanks Sr., Rudolph Valentino, Charlie Chaplin, James Cagney, Spencer Tracy, Fredric March, Errol Flynn, Fred Astaire, Clark Gable, Laurence Olivier, Gary Cooper, Humphrey Bogart, James Stewart, Tyrone Power, Cary Grant, Henry Fonda, Robert Mitchum, John Wayne, Kirk Douglas, Gene Kelly, Burt Lancaster, William Holden, Marlon Brando, James Dean, Rock Hudson, Montgomery Clift, Anthony Quinn, Gregory Peck, Richard Burton, Jack Lemmon, Sean Connery, Sidney Poitier, Charlton Heston, Steve McQueen, Peter O'Toole, Paul Newman, Clint Eastwood, Robert Redford, Dustin Hoffman, Roy Scheider, Warren Beatty, Dennis Hopper, Al Pacino, Jack Nicholson, Robert De Niro, Gene Hackman, Jon Voight, Harrison Ford, Kevin Kline, Kevin Costner, Michael Douglas, Christopher Walken, Mel Gibson, Sean Penn, John Travolta, Antonio Banderas, Tim Robbins, Samuel L. Jackson, Tom Hanks, Denzel Washington, Tom Cruise, Brad Pitt, Russell Crowe, Kevin Spacey, Will Smith, Jamie Foxx, Leonardo DiCaprio, Johnny Depp, Matt Damon, George Clooney. Parabéns, Philip Scott Johnson, pelo belíssimo trabalho.

A música fica por conta da interpretação de Antonio Menezes para a Suite para Solo de Cello n° 3 em C Maior BWV 1009 de Sebastian Bach.



domingo, 14 de fevereiro de 2010

O Começo da Linguagem

O clássico do diretor francês Jean-Jacques Annaud poderia muito bem suplantar muitas aulas de pré-história do ensino médio dada a sua importância histórica. Mas como explicar para os adolescentes de hoje a revolução causada pela descoberta do fogo e o uso da roda, numa época em que muitos deles usam gadgets de alta tecnologia, inventos já muito a frente dos incríveis canivetes suiços da geração anterior ?

O desafio dos professores ao abordar tópicos da história do homem é vencer a condição sonífera das histórias milenares, num tempo em que falar de pedra lascada e pinturas rupestres não parece um bom programa. Os obstáculos do ensino da história do homem não ficam apenas na dificuldade de se encontrar meios interativos e visualmente interessantes para alunos de escolas. Com um sistema de ensino retrógrado, pouco criativo e não muito afeito à cultura da leitura, da pesquisa e da visita a museus, adolescentes se tornam adultos desinformados e desinteressados na sua própria história no mundo.

O filme A Guerra do Fogo propõe uma aula de história bem legal e visualmente muito interessante, e como todo bom filme educativo e didático, ele faz parte dessa classe de filmes que ensinam, o que, diga-se, é, infelizmente, obra rara hoje em dia. A pré-história tem sido sistematicamente renegada no cinema, salvo raras exceções. Há referências à época em 2001, Uma Odisséia no Espaço ou em O Planeta dos Macacos. Como tema central, a situação é frustrante. O assunto tem sido basicamente tratado em comédias e desenhos, como, por exemplo, em Meu Amigão das Cavernas, Os Flinstones e A Era do Gelo. No caso de 10.000 a.c., apesar do seu orçamento milionário e caráter blockbuster, o filme fica muito aquém da obra de Annaud.

Lançado em 1981, numa produção Franco-Canadense, A Guerra do Fogo é uma obra que tem como objetivo levantar hipótese sobre a origem da linguagem. Para representar fielmente a época, há ausência total de linguagem verbal no filme e isso é um tanto quanto óbvio, mas o recurso dá seriedade ao trabalho e reforça a carga dramática da história dos três homo sapiens em busca de uma nova fonte de fogo para sua tribo. O fogo é então um elemento divino. Mas observar as interelações entre esses seres humanos de outrora também é uma tarefa prazerosa para os amantes da pré-história e interessados na própria história do homem no planeta. E não será difícil encontrar similitudes de comportamento com os homo sapiens sapiens de hoje, que, em muitas ocasiões, ainda seguem grunhindo.

A maneira como esses três hominídeos se relacionam, se comunicam e disputam territórios com animais e outras tribos menos desenvolvidas é destaque no roteiro assinado por ninguém menos do que Anthony Burguess, foneticista e consagrado autor do livro Laranja Mecânica. Seu trabalho não deixa dúvida nem desconfianças sobre os fatos históricos apresentados. Há momentos antológicos no filme, como a cena em que um dos homens ancestrais joga uma pedra pesada no outro e todos, até o apedrejado, têm um ataque de riso. Em outro momento, algumas fêmeas à beira de um riacho são surpreendidas sexualmente por alguns machos das cavernas e "a coisa" acontece sem repúdio nem acusações de estupro, tudo ali, nesse sentido, é muito natural, mostrando que o homem, desde a sua origem, é um ser prazerosamente sexualizado.

A Guerra do Fogo surpreende o público pela simplicidade da produção e sensibilidade com que trata o intrigante tema da pré-história, ainda recheado de muitas teorias e poucas certezas, um feito não muito fácil sem a classificação de entediante. O filme deve ficar na sua prateleira para uma boa aula de história e futuras revisões oportunas.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Oscar 2010: O Maior Prêmio do Cinema Mundial Anuncia Seus Indicados

As indicações para a 82ª cerimônia de premiação do Oscar da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, o maior prêmio do cinema mundial, reúnem tantos bons filmes e superproduções que fica difícil arriscar qualquer palpite sobre quem irá levar a estatueta de Melhor Filme. Apesar da grandiosidade da produção da maior bilheteria de todos os tempos, Avatar, ao passar a linha dos US$ 2 bilhões de arrecadação até o momento, Guerra ao Terror, segundo observadores e especialistas, pode levar o principal prêmio da noite.

Este ano o Oscar resolveu mudar e pela primeira vez desde 1943 indicou nada menos do que 10 títulos para o prêmio de melhor filme. Com tantos filmes bons seria injusto tirar um deles da disputa e a decisão pela mudança foi muito bem pensada. Os indicados são Avatar, Um Sonho Possível, Distrito 9, Educação, Guerra ao Terror, Bastardos Inglórios, Preciosa, Um Homem Sério, Up - Altas Aventuras e Amor sem Escalas. Eu particularmente esperava ver o filme 2012 nessa lista, uma vez que, assim como Avatar, chegou aos cinemas como uma das mais esperadas produções do ano, com um marketing tão poderoso quanto o favorito.

Se há algum sinal sobre quais deles podem ser considerados favoritos, vale a pena dar uma olhada no prêmio de melhor direção. James Cameron (Avatar), Kathryn Bigelow (Guerra ao Terror), Quentin Tarantino (Bastardos Inglórios), Lee Daniels (Preciosa) e Jason Reitman (Amor sem Escalas) reforçam suas produções na disputa. Mas o melhor será se resguardar de tal tarefa e deixar isso para as cartomantes e os críticos mais ousados. Uma nota interessante nesse time é ver marido (James cameron) e mulher (Kathryn Bigelow) dividirem a ponta da lista das opinões sobre quem vai ser o vencedor, tanto em filme quanto em direção.

Ainda lendo as entrelinhas hollywoodianas, podemos arriscar aqui alguns palpites um tanto quanto inevitáveis e certos, como o favoritismo de Up - Altas Aventuras ao prêmio de melhor longa de animação, já que o filme figura entre os 10 indicados para o prêmio de melhor filme. Há filmes muito menos cotados ao prêmio e certamente entraram na lista por alguma razão que a própria razão desconhece, como Um Sonho Possível, Educação e Um Homem Sério. É possível que, no caso de Um Sonho Possível o nome de Sandra Bullock, que disputa o prêmio de melhor atriz, tenha sido a razão do filme entrar na lista dos melhores do ano. Mas não acredito que os jurados tenham votado no filme com algum nível de sobriedade confiável.

Nessa categoria Sandra Bullock disputa diretamente o prêmio com Meryl Streep (Julie & Julia) e Mulligan (Educação) e a estatueta não ficar com alguém além dessas três favoritas. Também foram nomeadas a novata Gabourey Sidibe (Preciosa) e Helen Mirren, por interpretar a mulher de Leo Tolstói em The Last Station. Quanto às indicações para melhor ator, quatro dos indicados eram esperados: Jeff Bridges (Coração Louco), George Clooney (Amor sem Escalas), Colin Firth (A Single Man) e Morgan Freeman (Invictus). Jeremy Renner por Guerra ao Terror completa o time com menos chances.

A categoria dos atores coadjuvantes também traz algumas escolhas garantidas: Matt Damon (Invictus), Woody Harrelson (The Messenger), Christopher Plummer (The Last Station), e Christoph Waltz (Bastardos Inglórios). Correndo por fora Stanley Tucci disputa pela sua interpretação do assassino serial em The Lovely Bones. Na lista das atrizes coadjuvantes Mo'Nique é favorita por seu trabalho em Precisa, e inclui ainda Anna Kendrick e Vera Farmiga (ambas por Amor sem Escalas), Maggie Gyllenhaal (Coração Louco) e Penélope Cruz (Nine).

A seguir lista com os principais indicados:

Atriz Coadjuvante
Vera Farmiga, por Amor sem Escalas
Anna Kendrick, por Amor sem Escalas
Penélope Cruz, por Nine
Maggie Gyllenhaal, por Coração Louco
Mo´Nique, por Preciosa

Ator Coadjuvante
Matt Damon, por Invictus
Woody Harrelson, por O Mensageiro
Christopher Plummer, por The Last Station
Christoph Waltz, por Bastardos Inglórios
Stanley Tucci, por Um Olhar do Paraíso

Melhor Atriz
Sandra Bullock, por Um Sonho Possível
Helen Mirren, por The Last Station
Carey Mulligan, por Educação
Meryl Streep, por Julie & Julia
Gabourey Sidibe, por Preciosa

Melhor Ator
Jeff Bridges, por Coração Louco
George Clooney, por Amor sem Escalas
Colin Firth, por Direito de Amar
Morgan Freeman, por Invictus
Jeremy Renner, por Guerra ao Terror

Melhor Diretor
James Cameron, por Avatar
Kathryn Bigelow, por Guerra ao Terror
Quentin Tarantino, por Bastardos Inglórios
Lee Daniels, por Preciosa
Jason Reitman, por Amor sem Escalas

Roteiro Original
Guerra ao Terror
Bastardos Inglórios
O Mensageiro
Um Homem Sério
Up - Altas Aventuras

Roteiro Adaptado
Distrito 9
Educação
In The Loop
Preciosa
Amor sem Escalas

Melhor Filme Estrangeiro
Ajami (Israel)
o Segredo dos Seus Olhos (Argentina)
A Teta Assustada (Peru)
O Profeta (França)
A Fita Branca (Alemanha)

Melhor animação
Coraline
O Fantástico Sr. Raposo
A Princesa e o Sapo
The Secret of Kells
Up - Altas Aventuras

Melhor filme
Avatar
Guerra ao Terror
Um Sonho Possível
Distrito 9
Educação
Bastardos Inglórios
Preciosa
Um Homem Sério
Up - Altas Aventuras
Amor sem Escalas

Melhor Fotografia
Avatar, de Mauro Fiore
A Fita Branca, de Christian Berger
Harry Potter e o Enigma do Príncipe, de Bruno Delbonnel
Guerra ao Terror, de Barry Ackroyd
Bastardos Inglórios, de Robert Richardson

Melhor Direção de Arte
Avatar, de Rick Carter, Robert Stromberg e Kim Sinclair
O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus, de Anastasia Masaro, Dave Warren e Caroline Smith
Nine, de John Myhre e Gordon Sin
Sherlock Holmes, de Sarah Greenwood e Katie Spencer
The Young Victoria, de Patrice Vermette e Maggie Gray

Melhor Figurino
Brilho de uma Paixão, de Janet Patterson
Coco Antes de Chanel, de Catherine Leterrier
O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus, de Monique Prudhomme
Nine, de Colleen Atwood
The Young Victoria, de Sandy Powell

Melhor documentário Burma VJ
The Cove
Food, Inc.
The Most Dangerous Man in America - Daniel Ellsberg and The Pentagon Papers
Which Way Home

Melhor efeitos especiais
Avatar
Distrito 9
Star Trek

Só uma questão política ainda não revelada ou um surto acadêmico explicaria a ausência do filme 2012 nessa categoria. É um espanto que um filme com a arrecadação de 2012, US$ 225 milhões só no primeiro final de semana de exibião, tenha ficado simplesmente esquecido em categorias nas quais o filme deveria brigar pela estatueta. Seria honesto incluí-lo nas listas até por respeito ao público! Mas o Oscar há muito deixou de ser uma premiaçlão previsível. A 82ª edição do Oscar será realizada no dia 7 de março, no Teatro Kodak, em Hollywood, com transmissão para mais de 200 países.