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sábado, 15 de janeiro de 2011

OS FILHOS DA HISTÓRIA

A situação do Nordeste brasileiro, no final do século XIX, era muito precária. Fome, seca, miséria, violência e abandono político afetavam os nordestinos, principalmente a população mais carente. Toda essa situação, em conjunto com o fanatismo religioso, desencadeou um grave problema social. Nessa época, o beato Antônio Conselheiro, homem que passou a ser conhecido logo depois da Proclamação da República, liderou um movimento de apoio à monarquia e renúncia à república. Ele acreditava que havia sido enviado por Deus para acabar com as diferenças sociais e também com os pecados republicanos, entre estes, estavam o casamento civil e a cobrança de impostos. Com estas idéias em mente, ele conseguiu reunir um grande número de adeptos que acreditavam que seu líder realmente poderia libertá-los da situação de extrema pobreza na qual se encontravam. 

Nascido na vila de Quixeramobim, no interior do Ceará, Antônio Vicente Mendes Maciel cresceu em uma família de padrão de vida mediano. Durante sua infância teve uma educação diversa que lhe ofereceu contato com a geografia, a matemática e as línguas estrangeiras. Aos 27 anos, depois da morte de seu pai, assumiu os negócios da família. Não obtendo sucesso, abandonou a atividade. Na mesma época, casou-se com uma prima e exerceu funções jurídicas nas cidades de Campo Grande e Ipu. Com o abandono da mulher, Antônio começou a vaguear pelo sertão nordestino. Em seguida, envolveu-se com uma escultora chamada Joana Imaginária, com quem teve um filho. Em 1865, Conselheiro abandonou a mulher e o filho e retornou à sua peregrinação sertaneja. Nessas andanças, começou a construir igrejas, cemitérios e teve sua figura marcada pela barba grisalha, a bata azul, sandálias de couro e a mão apoiada em um cajado. 
 
Sob a perspectiva de alguém influenciado pelas contrariedades pessoais e os problemas sócio-econômicos do sertão, Antônio Conselheiro iniciou uma pregação religiosa defensora de um cristianismo primitivo. Defendia que os homens deveriam se livrar das opressões e injustiças que lhes eram impostas, buscando superar os problemas de acordo com os valores religiosos cristãos. Com palavras de fé e justiça, Conselheiro atraiu muitos sertanejos que se identificavam com a mensagem por ele proferida. Em 1876, autoridades lhe prenderam alegando que ele havia matado a mulher e a mãe, e o enviam de volta para o Ceará. Depois de solto, Conselheiro se dirigiu ao interior da Bahia. Com o aumento do seu número de seguidores e a pregação de seus ideais contrários à ordem vigente, Conselheiro fundou – em 1893 – uma comunidade chamada Belo Monte, às margens do Rio Vaza-Barris. Canudos foi o nome dado por seus opositores. Desde o início da comunidade, autoridades eclesiásticas e setores dominantes da população viam na renovação social e religiosa de Antônio Conselheiro uma ameaça à ordem estabelecida.

 De um lado, a Igreja atacava a existência de Canudos alegando que os seguidores de Conselheiro eram apegados à heresia e depravação. Por outro, os políticos e senhores de terra, com o uso dos meios de comunicação da época, diziam que Antônio Conselheiro era monarquista e liderava um movimento que almejava derrubar o governo republicano, instalado em 1889. Com o passar do tempo, as idéias iniciais difundiram-se de tal forma que jagunços passaram a utilizar-se das mesmas para justificar seus roubos e suas atitudes que em nada condiziam com nenhum tipo de ensinamento religioso; este fato tirou por completo a tranqüilidade na qual os sertanejos daquela região estavam acostumados a viver.



Em novembro de 1896, no sertão da Bahia, os conflitos civis foram iniciados com várias batalhas travadas entre os jagunços de Conselheiro e o exército do estado da Bahia e duraram por quase um ano, até 05 de outubro de 1897. Devido a enorme proporção que este movimento adquiriu, o governo da Bahia não conseguiu por si só segurar a grande revolta que acontecia em seu Estado. Por essa razão, pediu a interferência da República. Esta, por sua vez, também encontrou muitas dificuldades para conter os fanáticos. Somente no quarto combate, onde as forças da República já estavam mais bem equipadas e organizadas, os incansáveis guerreiros foram vencidos pelo cerco que os impediam de sair do local no qual se encontravam para buscar qualquer tipo de alimento e muitos morreram de fome. O massacre foi tamanho que não escaparam idosos, mulheres e crianças.Incriminada por setores influentes e poderosos da sociedade da época, Canudos foi alvo das tropas republicanas. 


Ao contrário das expectativas do governo, a comunidade conseguiu resistir a quatro investidas militares. Somente na última expedição, que contava com metralhadoras e canhões, a população apta para o combate (homens e rapazes) foi massacrada. A comunidade se reduziu a algumas centenas de mulheres, idosos e crianças. Antonio Conselheiro, com a saúde fragilizada, morreu dias antes do último combate. Ao encontrarem seu corpo, deceparam sua cabeça e a enviaram para que estudassem as características do crânio de um “louco fanático”. A Guerra de Canudos é tida como um dos principais conflitos que marcam o período entre a queda da monarquia para a instalação do regime republicano no Brasil. 


O documentário Sobreviventes – Filhos da Guerra de Canudos, do diretor Paulo Fontenelle, conta a história dos descendentes das pessoas que conseguiram sobreviver ou escapar de alguma forma ao massacre de Canudos. Destacam-se os depoimentos de idosos como o seu Antonio de Isabel, que hoje está com 110 anos de idade, e é o único homem vivo que conheceu Antonio Conselheiro; seu João de Régis, cujos pais escaparam nos últimos dias da guerra; Dona Zefa de Mamede, sua mãe saiu de dentro de Canudos no final da guerra para procurar comida e quando retornou a cidade já estava destruída; entre outros, o filme pretrende resgatar essa história que permaneceu esquecida por muito tempo.




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