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terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Retrospectiva Árabe

Junte algumas palavras árabes ou ligadas ao mundo árabe que você tenha ouvido com mais freqüência nos últimos tempos e não se surpreenda se o seu vocabulário estiver resumido a alguns nomes religiosos, de células terroristas ou de pratos de comida típica: Hezbollah, Al Qaeda, Kibe, Hamas, Esfirra, Taliban, Tabuli, Corão, Islâmismo, Fundamentalismo, damasco, homens bomba, humus, Al Jazeera, Jihad Islâmica...

A massificação da propaganda anti-terror instaurada no mundo ocidental por força de muitos atentados de ambos os lados do planeta tem escondido uma cultura milenar rica, pluricultural, vasta e, no caso do cinema, comovente. Por muito tempo, o cinema criado em torno de Hollywood e da Europa tirou do circuito comercial a excelente expressão cinematográfica do mundo árabe, uma forma de fazer cinema a partir de fatos simples que vão muito mais além dos aspectos políticos e religiosos da região. Eles descortinam um mundo submerso, não revelado nas manchetes dos jornais internacionais, um mundo feito menos de estórias e mais de histórias, ao retratar a essência do homem comum, do artesão, da criança, das pequenas coisas do dia-a-dia, dos costumes diários, da feira da esquina, do ganha-pão, das batalhas pessoais, do preconceito social, da reconstrução, da luta pela sobrevivência.

Filhos do Paraíso é um filme poderosamente simples e sensível de Majid Majdi, indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1999, e fala da parceria e lealdade entre irmãos na luta para recuperar um par de sapatos perdidos. O filme sensibiliza pela crueza com que a amizade entre os irmãos é tratada. Às Cinco da Tarde mostra o retrato do Afeganistão pós-Taliban, um país socialmente em reconstruão, aos olhos de uma mulher que, junto ao pai idoso e a cunhada viúva, luta pela sobrevivência quando tem que refazer a sua vida. Aqui o sonho engana uma realidade sombria e devastadora. Ou melhor, o traço força é usado para a sobrevivência, vencendo os traços fardos estagnadores. De B.Z. Goldberg e Justine Shapiro, Promessas de Um Novo Mundo, um documentário israelense extraordinário sobre a guerra entre israelenses e palestinos aos olhos de 7 crianças. O docmentário concorreu ao Oscar em 2002 e até hoje é aclamado por crítica e público onde quer que ele passe. Outro documentário muito bom vem da Índia e se chama Nascidos em Bordéis, de Ross Kauffman e Zana Briski, ganhador do Oscar, sobre a história de crianças filhas de prostitutas do bairro da luz vermelha, em Calcutá. O filme mostra a luta contra o preconceito para sair do círculo de prostituição em que muitas se encontram e também pela esperança de um mundo melhor. Osama, cujo título nada tem a ver com o nome do líder terrorista da Al Qaeda, e se trata de um nome masculino árabe comum, mostra que o terror no próprio Afeganistão, sob o julgo e controle do regime Taliban, é algo inimaginável, tal eram as atrocidades cometidas contra estrangeiros e mulheres, cruel e barbaramente assassinatos ou renegados à fome. O filme não tem a preocupação de conta uma estória de superação, mas de retratar os fatos num roteiro de Siddiq Barmak feito de pequenas histórias.

Há muitos outros filmes que este ano descobri no cinema árabe, que nada infelizmente conhecia antes de 2008 começar. E muitos outros poderia eu aqui destacar, como O Voto é Secreto (Irã), Neste Mundo (Paquistão/Inglaterra), A Cor do Paraíso (Irã), O Caçador de Pipas (EUA/Afeganistão), As Tartarugas Podem Voar (Curdistão/Iraque/Irã) - o filme se passa num campo de refugiados curdos e a cena final do filme ainda reverbera na minha memória, chocante, A Noiva Síria (Israel), Alila (Israel), A Banda e O Edifício Yacoubian (Egito), A Filha de Keltoum (Argélia) e outros tantos deveriam ser mencionados. Todos recomendáveis. Todos são politica e socialmente sinceros, filmes desprovidos do interesse de romantizar a miséria e o sofrimento. Todos são filmes sem firulas, filmes sem aparências. Todos são filmes sobre o ser humano e sua luta pela sobrevivência, pela reconstrução de vidas ou desistência delas. Todos fazem parte da excelente escola árabe de fazer cinema humano e consciencial.

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